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THE SKIN GAME

Dermocosmética, reviews, aconselhamento

O marketing e o hábito de fazer as pessoas sentirem-se mal

Para quem não sabe, eu faço a parte da comunicação da YOUTH LAB., o que implica que aquilo que é dito pela marca nas redes sociais e em press releases passa grande parte das vezes pelas minhas mãos. Não sou de marketing e vim aqui parar de pára-quedas, mas há um hábito na indústria que tenho tentado combater à força toda na comunicação que faço: eu não quero fazer as pessoas sentirem-se mal de forma a terem a necessidade de comprarem os produtos da marca. Eu quero que as pessoas comprem a marca por amor ao produto e não por ódio a si próprias.

 

Vamos ver aquilo que é geralmente um caso de estudo do marketing: a Veet na China.

Na China os produtos da Veet não se vendiam - primeiro porque não existem propriamente muitas pessoas hirsutas e segundo porque os pêlos corporais não eram um estigma social. E então uma empresa resolveu o assunto: criou uma série de anúncios que focavam o quão mau era o facto das pessoas terem pêlos e o facto de que os homens chineses gostavam muito mais de mulheres depiladas. O que não era verdade, mas se ouvirmos uma afirmação muitas vezes, começamos a achar que ela é verdade (os homens, que foram convencidos de que tinham de se juntar à sua irmandade e apreciar uma pele depilada, exigindo isso das mulheres, quer como as mulheres que começaram a sentir-se mal por terem pêlos). E foi assim que a China se tornou no mercado em maior crescimento de produtos depilatórios. Isto é a versão resumida, mas podem ler mais sobre o assunto aqui. Acho piada que a pessoa ainda tem a lata de dizer "não interessa quantos pêlos uma pessoa tem, interessa o quanto se preocupa com eles... se se preocupar o suficiente, um já é demais".

 

Isto para referir que, muitas vezes, o marketing é uma área sem escrúpulos. A minha marca tem um produto anti-celulítico, mas eu não o comuniquei como "quer um corpo pronto para ir para a praia? Então tem de usar isto!". Um corpo pronto para ir à praia é um corpo de uma pessoa que quer ir à praia, ponto. Não vou insultar ninguém para vender anti-celulíticos. Também não vou dizer a ninguém que "a idade é uma escolha" (juro que vi isto num outdoor ainda esta semana, mas já não me lembro qual era a marca). Chegar a uma idade avançada é um privilégio que infelizmente não é concedido a todos. Pode acontecer que uma pessoa não se reveja na idade que aparenta, e aí pode tentar combater os sinais de envelhecimento, pode simplesmente não gostar de os ver, mas não tem de se sentir mal por estar a envelhecer. Se não gosta do aspecto das rugas, então ok, temos aqui hidratantes e séruns que podem ajudar nesse aspecto. Mas não quero dizer a ninguém que tem de se envergonhar por ter "a cara naquele estado" e obrigá-la a gastar dinheiro que não quer em produtos.

 

Sabem qual é o produto que tenho mais facilidade em vender? Protectores solares. Convenço e converto imensa gente a protectores solares porque se existe uma maneira de tentar prevenir melanoma, então eu quero que as pessoas tentem preveni-lo. Acho mesmo que a posição das marcas de cosmética deveria ser esta: ajudar as pessoas a sentirem-se bem, sem ter de as envergonhar primeiro. E lamento fazer parte de um mundo que não concorda com esta premissa e que não olha a problemas quando chega a altura de vender.